Os municípios são completamente autónomos, tomam suas próprias decisões e controlam seus próprios recursos.
Rojava tornou-se uma espécie de santuário para todas as minorias. Curdos, Muçulmanos, Turcomanos, Cristãos e Árabes, todos vivem juntos pacificamente. Existe separação entre Estado e Igreja o que significa que as mulheres podem se vestir como querem e não existem restrições religiosas no comportamento público.
O movimento declarou um compromisso com a igualdade de género que se estende desde casa até ás linhas de frente, onde 7500 mulheres combatem lado a lado com os homens, algo único no Médio Oriente.
Mas eles estão completamente sozinhos e cercados de inimigos por todos os lados. Quanto tempo conseguirá Rojava aguentar em face a inimigos tão implacáveis e determinados?»
«6 Notas sobre a economia da revolução de Rojava
O programa econômico de Rojava, junto com os outros elementos da revolução, torna-a um experimento em ‘democracia sem Estado’ o qual vale a pena apoiar e aprender.
Muito já foi escrito sobre a revolução em Rojava, um território composto por três cantões de maioria curda no norte da Síria, que se tornou famoso pela defesa da cidade de Kobane contra as forças do Estado Islâmico. Após a Síria entrar em guerra civil em 2011, o povo de Rojava, incluindo muitos esquerdistas curdos, tomaram a região e embarcaram num projeto radical que eles chamam de ‘autonomia democrática’. Esse projeto visa criar uma democracia sem o Estado através da criação de conselhos e comunas em vários níveis políticos para governar o território, assim como trabalhar para abolir a polícia. Rojava também é famosa (com justiça) por colocar uma política feminista no centro do projeto político. Implementou sistemas de quota para participação feminina em várias comunas e conselhos, sendo quase tão mencionadas quanto a participação armada das mulheres nas forças de defesa de Rojava. Mas tudo isso raramente é suficiente para alguns segmentos da esquerda – a questão que não cala é, sem dúvida, e as relações de classe e a economia? Afinal, não é realmente comunismo integral sem a tomada dos meios de produção…
Não muito tem sido escrito especificamente sobre a economia de Rojava, fora alguns poucos relatos de delegações que visitaram a região e entrevistas com representantes. Porém, o que sabemos até agora é que a transformação econômica de Rojava é tão radical quanto o resto do projeto.
1. O estado da economia antes de 2011
As regiões que compõem Rojava foram deliberadamente deixadas no subdesenvolvimento pelo regime Assad e direcionadas para suprir a Síria com matérias primas, incluindo trigo, algodão e petróleo. A região era expressiva como fonte desses produtos, sendo uma das regiões mais férteis da Síria e fonte da maior parte de seu petróleo.
Contudo, embora houvesse vários milhares de poços de petróleo na região, havia poucas fábricas e nenhuma refinaria ou engenho. Cerca de metade da terra era propriedade estatal gerida por pessoas do governo como feudos privados. Após o início da revolução a maioria dessas pessoas e dos capitalistas que havia fugiram. Os recursos que eles controlavam e que foram deixados para trás foram expropriados pelos conselhos locais.
2. A economia social
A prioridade para os vários níveis do governo de Rojava é implementar o que eles chamam de ‘economia social’ – um sistema econômico construído com base em uma série de COOPERATIVAS em todos os setores econômicos. O objetivo inicial é se tornar autossuficiente para satisfazer necessidades básicas como comida e combustível. No momento isso é menos um ideal e mais uma necessidade uma vez que Rojava vive efetivamente sob embargo, sendo muito difícil importar para a região até mesmo os suprimentos mais básicos.
O programa econômico imediato visa criar uma infraestrutura para prover as necessidades vitais. Rações de pão são fornecidas pelas administrações locais a cada família e combustível é distribuído pelas comunas locais. Até agora duas refinarias de petróleo foram construídas assim como uma quantidade de engenhos e de plantas de processamento de laticínios geridos publicamente. Desde 2011 a nova administração tem tomado as terras que antes eram detidas pelos quadros do governo sírio e distribuído muitas delas a COOPERATIVAS rurais auto-organizadas.
3. Dinheiro e comércio
O objetivo final é construir a economia inteira de Rojava sobre a BASE DE COOPERATIVAS ou outras pequenas unidades econômicas, juntando-as em uma rede na qual o uso do dinheiro seja minimizado ou eliminado. O que é produzido atualmente é vendido às várias entidades administrativas ou nos mercados locais onde o controle de preços é imposto aos produtos que são considerados ‘essenciais’.
A moeda síria ainda é usada, mas embora empréstimos possam ser feitos, JUROS NÃO PODEM SER COBRADOS. Não há bancos no momento, embora haja um plano de criação de bancos para guardar economias, e o capital privado não será impedido de investir na região uma vez que ele adira aos princípios econômicos mais amplos da região. Muitos dos produtos nos mercados locais são contrabandeados para a região, um comércio que ainda está para ser coletivizado…
4. Educação
Central ao programa econômico é o desenvolvimento do setor educacional, incluindo um sistema acadêmico que oferece uma gama de cursos intensivos. Sob o regime Assad, competências e conhecimentos profissionais eram restritos aos membros do regime. No sistema acadêmico há uma estratégia consciente de desprofissionalização de modo a quebrar a divisão entre profissionais e não-profissionais e prevenir o aparecimento de uma nova classe tecnocrática.
As próprias lições na academia enfatizam fortemente a partilha de experiência entre os alunos de modo a quebrar a hierarquia professor-aluno, e focam a resolução de problemas em vez da aprendizagem por memorização. Fundamentalmente, a participação é uma das principais competências adquiridas nas academias, abrindo os vários conselhos e comunas a um engajamento social mais amplo, que pode não acontecer de outra forma (a participação é uma competência desigualmente distribuída em Rojava da mesma forma como é no Reino Unido).
5. Sindicatos e associações
Uma vez que grande parte da economia está nas mãos das COOPERATIVAS ou nas mãos privadas de indivíduos, os sindicatos e associações são limitados em número. Há, contudo, um número de sindicatos e associações, incluindo vários de agricultores, engenheiros e agrônomos, assim como uma associação de mulheres que se organiza pelos direitos das trabalhadoras, remuneradas e não remuneradas, que cuidam de pessoas.
6. A polícia
Uma associação que não será formada é a de policiais. O plano em Rojava é, ao fim, abolir a polícia, embora como a Asayis (segurança civil) responde aos conselhos locais e não ao Estado (não existente), o termo ‘polícia’ não seja usado. A função da Asayis é garantir a segurança da população e levar as disputas aos conselhos locais onde elas são na maioria das vezes dirimidas através de diálogo. O plano final é garantir que a maioria da população tenha treinamento em autodefesa e resolução de litígios de modo a difundir esses meios e capacidades a todos. O quadro geral é o de uma ECONOMIA COOPERATIVA onde as necessidades básicas são fornecidas pelas administrações locais ainda que estruturas de mercado ainda existam, embora em formas limitadas. Competências e educação, incluindo aquelas que envolvem autodefesa, estão sendo coletivizadas – com o objetivo de erradicação de hierarquias de conhecimento e de capacidades para violência. O programa econômico de Rojava, junto com os outros elementos da revolução, torna-a um experimento em ‘democracia sem Estado’ o qual vale a pena apoiar e aprender.»
Original: http://wire.novaramedia.com/2015/02/6-notes-on-the-economics-of-the-rojava-revolution/
Mais informação:
http://curdistam.blogaliza.org/tag/rojava/
https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/?s=rojava
http://rojavaplan.com/pt/about.html
https://www.esquerda.net/artigo/porque-e-que-o-mundo-ignora-os-revolucionarios-curdos-na-siria/34432
https://www.jornalmapa.pt/2015/01/30/rojava-guerra-e-revolucao/
DAS RUINAS DE ROJAVA NASCE UM NOVO MUNDO COOPERATIVO!
«Na Síria cerca de 2 milhões de pessoas em ROJAVA tomaram a região e embarcaram num projeto radical que eles chamam de ‘autonomia democrática’. Esse projeto visa criar uma democracia autogestionada sem Estado (ou de baixo para cima) através da criação de assembleias populares e cooperativas.
Os municípios são completamente autónomos, tomam suas próprias decisões e controlam seus próprios recursos.
Rojava tornou-se uma espécie de santuário para todas as minorias. Curdos, Muçulmanos, Turcomanos, Cristãos e Árabes, todos vivem juntos pacificamente. Existe separação entre Estado e Igreja o que significa que as mulheres podem se vestir como querem e não existem restrições religiosas no comportamento público.
O movimento declarou um compromisso com a igualdade de género que se estende desde casa até ás linhas de frente, onde 7500 mulheres combatem lado a lado com os homens, algo único no Médio Oriente.
Mas eles estão completamente sozinhos e cercados de inimigos por todos os lados. Quanto tempo conseguirá Rojava aguentar em face a inimigos tão implacáveis e determinados?»
Para os que ainda remetem o conceito de sociedade contra o Estado de Pierre Clastres a circunstâncias duplamente anacrônicas e duplamente locais— as sociedades “primitivas” da Amazônia indígena votadas à extinção (supunha o próprio Clastres), de um lado, e a convulsão libertária do pensamento euro-americano dos longínquos idos de 68, de outro —, este livrinho de Abdulah Öcalan sobre o projeto-em-ato de uma confederação democrática curda serve como evidência contundente de sua radical contemporaneidade, sua potência de deslocamento, melhor dizendo, de relocalização múltipla. Em uma trajetória que se vai progressivamente se disseminando no seio dos, estes sim, anacrônicos dogmas da esquerda dita comunista, Öcalan, líder do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), originalmente de orientação marxista-leninista, dá testemunho do abandono definitivo da confiança na forma-Estado como solução viável para qualquer verdadeira sociedade democrática no mundo de hoje (e amanhã). O esboço de uma forma de organização coletiva de larga escala — o milenar “enclave” curdo no Oriente Médio (mais seus milhão e meio de membros em diáspora) — coletivo que, situando-se geopoliticamente entre quatro Estados “nacionais”, funciona segundo princípios e processos que conjuram a forma-Estado, dada a articulação constitutiva (e constituinte) dessa forma — em sua encarnação mais acabada, o Estado-nação moderno — com o capitalismo mundial, mostra que o célebre mote “a imaginação no poder” dos muros de 68 se traduz na prática política do Confederalismo Libertário como “a imaginação contra o poder”: uma outra imagem da organização política dos povos, onde o conceito de poder se vê radicalmente separado do Estado. Menos que Clastres, entretanto, é o “comunalismo” e o “municipalismo libertário” de Murray Bookchin, ativista e pensador pós-anarquista (e, antes, pós-sindicalista, pós-comunista) norte-americano, ainda pouco conhecido entre nós, que servem de inspiração maior para a virada radical de Öcalan na direção de um conceito não-nacionalista de nação, uma nação multicultural, multiétnica, organizada pelo princípio da autonomia confederada em todos os níveis do coletivo. - Eduardo Viveiros de Castro
Descarregar aqui:
https://www.amazon.com.br/Confederalismo-Democr%C3%A1tico-Abdullah-%C3%96calan-ebook/dp/B01IYT94J6
OU
http://ocalanbooks.com/downloads/PT-BR-confederalismo_democratico_2016.pdf
Este documentário explora o processo de implantação da Autonomia Democrática na região norte da Síria habitada principalmente pelos curdos, assírios, caldeus, árabes e yazidis.
Traduzido e legendado por Anarquismo em Movimento. Mostra um pouco sobre como os curdos estão vivendo e se autogerindo através da organização popular.